sexta-feira, 6 de junho de 2008

A essência do fanatismo

A essência do fanatismo reside no desejo de obrigar os outros a mudar. Nessa tendência tão comum de melhorar o vizinho, de corrigir a esposa, de fazer o filho engenheiro ou de endireitar o irmão, em vez de deixá-los ser. O fanático é uma das mais generosas criaturas. O fanático é um grande altruísta. Está mais interessado nos outros que em si próprio. Quer salvar a nossa alma, redimir-nos. Livrar-nos do pecado, do erro, do tabaco, da nossa fé ou da nossa carência de fé. Quer melhorar os nossos hábitos alimentares, ou curar-nos do alcoolismo e do hábito de votar. O fanático morre de amores pelo outro. Das duas uma: ou nos deita os braços ao pescoço porque nos ama de verdade, ou se atira à nossa garganta em caso de sermos irrecuperáveis. Em qualquer caso, topograficamente falando, deitar os braços ao pescoço ou atirar-se à garganta é quase o mesmo gesto. De uma maneira ou de outra, o fanático está mais interessado no outro do que em si mesmo, pela simples razão de que tem um mesmo bastante exíguo, ou mesmo nenhum mesmo.

Amos Oz, contra o fanatismo, Porto: Asa Editores, 2007, pp. 22-23.

3 comentários:

Anónimo disse...

e quando somos "fanáticos" de nós próprios?
T.

CF disse...

Como assim? Nos queremos mudar à força? Pois... suponho que seja outra forma de fanatismo! E lá está: é porque não nos temos em grande conta, é porque temos uma auto-estima demasiado exígua ou inexistente. E talvez essa seja a única coisa que temos que mudar!
Beijinhos, T.!

CF disse...

Como assim? Nos queremos mudar à força? Pois... suponho que seja outra forma de fanatismo! E lá está: é porque não nos temos em grande conta, é porque temos uma auto-estima demasiado exígua ou inexistente. E talvez essa seja a única coisa que temos que mudar!
Beijinhos, T.!