domingo, 29 de fevereiro de 2004

Aqui fica um post da Ana Lúcia, enviado para o nosso e-mail:

não resisti à tentação de declarar, a meio do livro, que somos umas sortudas por alguém, quem?, se ter lembrado desta obra. O clube está a cumprir mais uma função - recuperar autores portugueses absolutamente geniais e relativamente(?) esquecidos.Não acham?
ana lúcia
ps:o blog está 1 must

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2004

Olá, Ana!

Sê bem-vinda ao nosso blogue. De facto parece-me um meio muito interessante de irmos partilhando as nossas opiniões.
Em relação ao teu post, e mais concretamente em relação ao José Luís Peixoto: por ser uma escrita tão íntima acho complicado submetê-la a discussão, nomeadamente o "Morreste-me". Suponho que possa ter tido um efeito catártico no escritor, pode ter providenciado uma forma de lidar com o desgosto tão profundo que é o de se perder um pai. E penso que também pode ter esse efeito nos seus leitores. Li algures numa entrevista ao Peixoto que ele achava que a escrita podia ser um acto libertador, tal como a leitura. Apesar de ser sortuda o bastante para ainda ter comigo os meus pais, a leitura desse pequeno livro despertou em mim muitas emoções que não sei se estaria disposta a discutir a um nível mais intelectual. Estou com o mesmo problema com "Uma casa na escuridão", que vai ser discutido no meu outro clube de leitura para a semana que vem, e talvez por isso mesmo tenha oferecido alguma oposição à escolha de "Nenhum olhar" para discussão no nosso. O que acham? Acham que há um limite para a discussão de uma escrita tão personalizada? Provavelmente um americano não teria qualquer problema em fazê-lo, é vê-los nos filmes a discutir constantemente a sua vida privada :-) Mas não acham que concretamente os portugueses têm um maior pudor quanto a exporem as suas emoções mais profundas? Ou serei só eu?

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2004

olá pessoal:

Finalmente cheguei afinal era bem fácil eu é que não me dediquei verdadeiramente. Parece muito interessante este sistema de tornar on-line e em tempo real as nossas considerações...vamos a isso.

Adorei o encontro sobre o nosso Don DeLillo, não pensei que um livro pudesse surpreender tanto mesmo depois de lido e arrumado na prateleira.. se já tinha gostado, fiquei fã das possíveis análises que pudemos e pudemos construir. Foi um bom trabalho!! Acrescentaria à acta da nosssa Cris o facto de se tratar, como penso ter sido referido, de uma alucinante viagem de autoconhecimento, de encontro e/ou reencontro de Eric consigo mesmo, com as suas raizes, com o seu assassino e com a sua própria finitude.

Ainda não me lançei à Madona, acabei por me encantar de facto com o "morreste-me" do Peixoto que, apesar de já muito comentado, me deixou rendida à escrita, ao sentimento, à forma simples e tão humana de tornar dizível o que de mais íntimo temos em nós.

Abraços a todas e boas leituras

ana

terça-feira, 24 de fevereiro de 2004

Gostava só de acrescentar que houve dois tempos no livro, que depois de (finalmente) terminar e após a nossa discussão me fizeram reflectir sobre tudo o que foi dito.
Em primeiro lugar e acerca do 11 de Setembro, eu confesso que achei (e mesmo ao ler) que era um exagero da nossa parte tentar encontrar uma relação entre o 11 de setembro e a escrita. Houve quem sugerisse a cena dos nus. Pois essa cena sem dúvida, é uma imagem que encontraríamos no portfólio do fotografo Spencer Tunick, mas ao ler com atenção e cito um excerto da página 175 (versão original) “Whatever has happened to us, I thought, probably happened without warning...” , vejo que pode ser uma referência ao 11 de Setembro com um olhar mais cinematográfico, já que na altura foi muito referido o encontrar de corpos e partes de corpos no “ground zero” pelos media.
O segundo ponto é a relação que se supõe entre a mãe do Eric e o chefe de segurança Torval. Na altura da reunião não pude comentar pois não tinha alcançado essa parte do livro, entretanto prestei especial atenção quando Eric faz referência à mãe e encontro essa relação no excerto da página 185 “At first I didn’t care about their relationship. But now I’m thinking they did amazing things because why else would he want to whisper her name to his handgun.” e mais à frente na mesma página “I can see his dumb bulk on top of her”.
Gostaria só de adiantar que a discussão foi, muito positiva, visto que me incentivou acabar o livro e reflectir sobre ele numa perspectiva diferente.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2004

Aqui fica o primeiríssimo e-mail enviado para o nosso blogue pela Angela:

olá!

a cristina contou-me que tinham um blog! espreitei, gostei e junto um texto que pode ser discutido a propósito do próximo livro...

bjs para todas...

angela



Il m'a fallu découvrir


Il m'a fallu découvrir que :
La logique est la science de gérer les rentes de la stupidité ;
Les politiciens ne sont pas tout à fait des poules parce qu'ils
caquettent et ne pondent pas d'oeufs ;
Les portefeuilles des plénipotentiaires sont emplis d'araignées pour
tisser les toiles qui nous immobilisent ;
Les militants de tous les partis ont de la peau de chemises
engoncées ;
La famille est un banc de piranhas autour d'une vache sacrée ;
La sociologie est un total manque d'humour face à la décadence ;
Les gestionnaires distillent une sueur froide qui nous enrhume ;
Les nations hissent les drapeaux pour mettre les phallus d'aplomb et
se masturber ;
Les gauches et les droites résultent d'un pacte consistant à ne pas
intervertir leurs rôles ;
Le socialisme est un stratagème pour nier aux exploiteurs leur droit
à disparaître ;
Le libéralisme est une astuce de l'Etat pour forger des menottes
avec la liberté ;
Les intellectuels sont un emmerdement avec lequel le créateur
n'avait pas compté ;
L'éducation étant la providence des imbéciles qui sont le plus grand
nombre, le monde se trouve imbécillité par l'éducation ;
Le système est la crèche de la débilité mentale et la fosse commune
de l'intelligence ;
L'économie, c'est acquérir le vice du tabac parce qu'on s'est acheté
un briquet ;
Des vaincus, l'histoire ne récite pas le chapelet parce qu'ils se
sont rendus à la raison ;
Pour conclure que :
L'heure romantique à laquelle les dieux nous demandent la
désobéissance est arrivée. J'exécute leurs volontés. A dater d'aujourd'hui,
si quelqu'un veut me rencontrer, qu'il me cherche entre le rire et la
passion.
(10 janvier 1983)
Natàlia Correia

terça-feira, 17 de fevereiro de 2004

O próximo livro que discutiremos é "A Madona", de Natália Correia.
Aqui ficam algumas informações sobre a autora:


Natália de Oliveira Correia nasceu na Ilha de São Miguel, nos Açores, a 13 de Setembro de 1923.
Estudou no liceu Antero de Quental até 1934. Mudou-se nesse mesmo ano para o liceu Filipa de Lencastre, em Lisboa.
Natália Correia é considerada um dos ícones da poesia portuguesa contemporânea. Destacou-se também como ensaísta e romancista, possuindo trabalhos no teatro e investigação literária.
Em 1942, casa-se com Álvaro Pereira. No ano de 1949, une-se a William Creighton Hylen, de quem posteriormente se separaria para casar, em 1950, com Alfredo Machado.
Em 1944, inicia sua carreira de jornalista na Rádio Clube Português.
Em 1960, grava o disco "Natália Correia Diz Poemas de Sua Autoria".
Conhece em 1962, Dórdio Guimarães, parceiro de diversos trabalhos no cinema e na televisão. Casa-se com Dórdio em 1990, com quem permaneceu até o fim da vida.
Destacou-se na luta contra o fascismo. Teve vários dos seus livros apreendidos pela censura. Foi condenada a três anos de prisão, com pena suspensa, por abuso de liberdade da imprensa.
Em 1971, ao lado de Isabel Meyrelles cria uma sociedade , cujo resultado será o Botequim (local de encontro, convívio e tertúlia, onde nasciam idéias culturais efervescentes).
Foi diretora literária dos Estúdios Cor e da Editora Arcádia. Em 1976 tornou-se diretora do "Século Hoje", da "Vida Mundial", e assessora do então secretário de Estado da Cultura, David Mourão-Ferreira.
Teve grande notoriedade no cenário político português, sendo eleita deputada pelo Partido Socialista, passando depois a independente.
Morreu em Lisboa, a 16 de Março de 1993, ano em que é publicada, em dois volumes, pelo Círculo dos Leitores, a sua obra poética completa: "O Sol nas Noites e o Luar nos Dias".
Obras importantes de sua autoria:
Obras poéticas: Rio de Nuvens (1947), Poemas (1955), Dimensão Encontrada (1957), Passaporte (1958), Comunicação (1959), Cântico do País Imerso (1961), O Vinho e a Lira (1966), Mátria (1968), As Maçãs de Orestes (1970), Mosca Iluminada (1972), O Anjo do Ocidente à Entrada do Ferro (1973), Poemas a Rebate (1975), Epístola aos Iamitas (1976), O Dilúvio e a Pomba (1979), Sonetos Românticos (1990), O Armistício (1985), O Sol das Noites e o Luar nos Dias (1993), Memória da Sombra (1994, com fotos de Antônio Matos)
Ficção: Anoiteceu no Bairro (1946), A Madona (1968), A Ilha de Circe (1983).
Teatro: O Progresso de Édipo (1957), O Homúnculo (1965), O Encoberto (1969), Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente (1981), A Pécora (1983).
Ensaio: Poesia de arte e realismo poético (1958), Uma estátua para Herodes (1974).
Obras várias: Descobri que era Européia (1951 - viagens), Não Percas a Rosa (1978 - diário), A questão acadêmica de 1907 (1962), Antologia da Poesia Erótica e Satírica (1966), Cantares Galego-Portugueses (1970), Trovas de D. Dinis (1970), A Mulher (1973), O Surrealismo na Poesia Portuguesa (1973), Antologia da Poesia Portuguesa no Período Barroco (1982), A Ilha de São Nunca (1982).

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2004

Outra coisa...
Ocorreu-me entretanto uma ideia:
enquanto no nosso primeiro livro "Sinfonia em Branco" de Adriana Lisboa, estava patente um universo eminentemente feminino (mesmo a personagem do pintor tinha traços muito femininos), neste temos um universo extremamente masculino. Não acham? Querem discutir?
Cristina

Ora aqui vai então o texto que redigi sobre a nossa discussão do livro "Cosmópolis" de Don DeLillo de ontem à tarde

As opiniões dividiram-se bastante. Houve quem tivesse gostado
bastante do livro, como a Ana e a Guida, e quem não tivesse
gostado nada, como a Rita, que fez um esforço para ler até ao fim.
Depois houve as opiniões mais moderadas, como a Cristina e a
Jennifer, que sem terem propriamente adorado o livro, lhe
reconheceram alguns méritos.
A Rita queixou-se que a estrutura do texto era deficiente, que as
personagens não tinham grande densidade e eram fúteis e superficiais
e que toda a realidade retratada era frívola e artificial. A Ana
Lúcia acrescentou que, mais que plástica, a realidade do livro é
metálica, pela sua frieza. A Guida argumentou que era assim a alta
roda das finanças e que, nesse aspecto, terá sido fiel. A Cristina
disse que normalmente gostava que os livros constituíssem janelas
para outros mundos desconhecidos e que, de facto, este livro a
transportava para um mundo que lhe é completamente alheio, mas que
ainda assim lhe era bastante desagradável.
A Ana Lúcia referiu com especial agrado a forma como o livro é
contado, gostou da omnisciência do narrador que opta por revelar
pequenas porções do que passa no íntimo das personagens.
Á Ana agradaram-lhe particularmente os pormenores mais "surreais" da
obra, como o episódio do exame médico ou a episódio da filmagem da
cena de nus, ou a casualidade dos encontros fortuitos com a mulher.
Esses pontos foram relativamente consensuais, todas as leitoras os
acharam bastante originais.
De seguida falou-se sobre o eventual papel que os acontecimentos do
11 de Setembro (que aconteceu alegadamente a meio da escrita do
livro) terão tido no processo de criação da obra. Ninguém conseguiu
situar um ponto distinto de transição. A Ana Lúcia sugeriu que os
dois sub-capítulos inseridos com a confissão do assassino seriam
posteriores, a Cristina discordou, na medida em que têm um papel
importante na questão do tratamento do tempo na obra. Sugeriu,
contudo, que a cena dos corpos nus deitados no asfalto poderia ter
sido inspirada nos acontecimentos. Foi dito que o próprio DeLillo
terá afirmado que pouco vieram influenciar a história, na medida em
que já ia avançada. A Cristina disse que, ainda que não tenha
influenciado a escrita do livro influenciou indubitavelmente a sua
recepção.
A Cristina procurou ainda expor a sua leitura do tratamento do tempo
no livro, em parte retirada de um artigo que leu (e que está à
disposição de todas na secção "files" do nosso grupo yahoo). Diz o
referido artigo que o livro é uma viagem do dia para a noite, da
vida para a morte, mas também do presente para o passado, na medida
em que a personagem central busca de forma algo obsessiva e contra
todas as opiniões do seu staff chegar a um determinado ponto da
cidade – uma barbearia – que sabemos, mais para o fim, localizar-se
no bairro onde cresceu o seu pai, a barbearia já frequentada pelo
mesmo e onde este o levou ainda criança (o pai terá falecido tinha
Eric 4 anos). É, pois, um retorno às origens, a um passado que já
era passado na sua infância mas que constitui a única coisa mais
próxima que tem de raízes. Temos então uma narrativa que avança
cronologicamente no tempo real mas que recua no tempo psicológico.
Temos ainda as duas confissões do assassino que são posteriores no
tempo e que são inseridas no texto: primeiro a confissão posterior
ao assassinato e depois a que o antecede. Tudo isto resulta numa
concepção circular do tempo em que passado, presente e futuro se
confundem e se tornam, de certa forma, simultâneos. Não esquecer,
ainda, que a personagem central, é o homem que ganha a vida a
adivinhar o futuro. É ele que analisa as tendências dos mercados, e
que, através de analogias com fenómenos da natureza, procura
encontrar padrões de comportamentos dos mercados por forma a
investir da melhor forma. No entanto, ele menospreza a importância
do acaso, da assimetria, do fortuito, e é essa a grande lição que
ele vai aprender nesta sua última viagem. Vai aprender que é
impossível prever o futuro porque há imprevistos que fogem ao nosso
controlo. Ele continua, no fim do livro, a ser o homem que vê o
futuro, com o auxílio da tecnologia que tem ao dispor (vê-se a si
próprio numa morgue de hospital no visor do seu relógio), mas também
é o homem profundamente aliviado porque a assimetria da sua próstata
é apenas isso, mais um dos acasos que não podemos controlar. A
Cristina sugeriu ainda, em tom de brincadeira, que a próstata
assimétrica, tantas vezes referida ao longo da narrativa, seria a
chave da leitura do livro, na medida em que simboliza tudo aquilo
que não podemos controlar, que foge à "normalidade", e que, como tal
nos assusta e nos escapa, por não conseguirmos encaixar dentro das
categorias que criamos constantemente.
A Ana Lúcia referiu ainda que a próstata assimétrica é o que liga os
dois homens, o protagonista e o seu assassino, e que os dois homens
constituem "as duas faces de uma mesma moeda".
Foi consensual que, mais do que de um assassinato, se tratou aqui de
um suicídio, pois o protagonista preparou a sua própria morte.
Percebe-se mais para o fim do livro que a própria catástrofe
financeira que o assola foi preparada por ele: na medida em que ele
constituía uma referência para os outros investidores, a partir do
momento em que começou a investir no yen provocou uma tremenda
agitação no mercado e a subida dessa moeda até valores completamente
impensáveis. Ele continua a investir, e pensamos primeiro que se
trata de uma acção arrojada de quem sabe que o yen não poderá subir
mais, apesar dos seus conselheiros lhe sugerirem prudência, mas
percebemos depois que se trata de um verdadeiro suicídio financeiro.
O suicídio real também se segue: apesar dos avisos de que recebeu
ameaças à sua vida, arrisca-se num comportamento irresponsável.
Vai "largando" os guarda costas e chega mesmo a matar o seu chefe de
segurança, o único que podia ainda evitar que se defrontasse com o
seu destino. É ele que, novamente por coincidência (serão os acasos
e coincidências o ponto de contacto com o Paul Auster? – sugeriu a
Rita) vai ao encontro do seu assassino (ou um mero meio para um
suicídio?) nos escombros onde este habita.


Completem, minhas amigas, alterem, acrescentem, o que quiserem...
não me lembro de tudo o que foi dito, com certeza que poderá ficar
mais rico.

Gostei disto. Parece-me mais fácil do que o yahoo. Acho que isto é capaz de resultar. Ainda não vejo aqui, a tua intervenção Cris. Acho que poderia ser bom.
A reunião ontem correu bem e creio que todas as pessoas saíram da reunião com a sua opinião alterada em relação ao livro. É bom para suscitar as ideias.

domingo, 15 de fevereiro de 2004

Olá, amigos!
Serve este espaço para discutirmos as nossas leituras, publicar pequenos (ou grandes!) apontamentos das nossas vidas, observações, o que quer que nos apeteça.
Espero que venha a ser animado!