domingo, 8 de janeiro de 2006

O título da nossa presente leitura refere-se a uma canção dos Beatles.
Aqui fica a letra:

Norwegian Wood

I once had a girl,
Or should I say
She once had me.
She showed me her room,
Isn’t it good?
Norwegian wood.
She asked me to stay and she told me to sit anywhere,
So I looked around and I noticed there wasn’t a chair.
I sat on a rug
Biding my time,
Drinking her wine.
We talked until two,
And then she said,
‘It’s time for bed’.
She told me she worked in the morning and started to laugh,
I told her I didn’t, and crawled off to sleep in the bath.
And when I awoke
I was alone,
This bird has flown,
So I lit a fire,
Isn’t it good?
Norwegian wood.


O livro escolhido para este mês foi "Norwegian Wood", de Haruki Murakami, outro japonês.


O livro seguinte foi "Nunca me deixes", ou, no original "Never Let Me Go", de Kazuo Ishiguro.
Novamente devo reconhecer que não sei onde estão as notas que tirei durante a nossa discussão e, como tenho muito mais onde empregar as minhas células cinzentas neste momento, serve este post apenas para que o livro marque presença no blog.
Em traços muito gerais, voltámos a ter um livro que dividiu completamente as leitoras. Algumas (como eu, a Rita e a Ana Cristina) aderimos incondicionalmente à beleza da escrita de Ishiguro, às suas subtilezas, à estranheza dos temas, mesmo à passividade das personagens, de uma tremenda complexidade emocional. Outras (quase o resto das leitoras) não apreciaram a obra, consideraram a narrativa incoerente e irritaram-se com a incapacidade das personagens para se rebelarem contra o cenário absolutamente abominável que representava o resto das suas vidas.
Em todo o caso, o livro deu azo a uma viva discussão, onde entraram questões como a bioética, no que diz respeito à clonagem. Falou-se do paralelismo da situação dos clonados da obra com a dos escravos. A atitude mais ética será indubitavelmente a da sua libertação, apesar dos problemas económico que esta decisão possa acarretar. Também aqui, aflige a indiferença daqueles que conhecendo a situação dos clonados, opta por fechar os olhos a essa situação e a demitir-se de tomar medidas no sentido de acabar com a exploração desses seres humanos. Também na altura do esclavagismo se argumentava que os escravos não eram seres humanos, não tinham alma. A mesma questão se coloca em "Nunca me deixes". Ao contrário outras opiniões surgidas durante a discussão, penso que fica muito claro que estes seres são profundamente humanos. Mesmo na sua incapacidade de reacção.
Tal como estabeleci o paralelismo com a questão do esclavagismo, também fui ainda um pouco mais longe, aplicando esta mesma ordem de ideias à forma como tratamos os animais, justificando as sucessivas crueldades que lhes infligimos com a assunção de que não têm a capacidade de pensar, de sentir, de sofrer. Penso que, novamente, e quando as mentalidades evoluirem um pouco mais, seremos obrigados a rever e a alterar os nossos comportamentos perante os nossos companheiros de planeta.


A leitura que se seguiu à "Misteriosa Chama" foi, nem mais nem menos do que o monumental "Ana Karenine", de Leo Tolstoi. Novamente tentamos aproveitar as potencialidades do clube de leitura, no que diz respeito a uma leitura mais acompanhada e disciplinada para nos atirarmos a um clássico que muitas de nós já queriam ter lido há muito tempo. Precisámos de um pouco mais de tempo, mas lá conseguimos (quase) todas levar o navio a bom porto.
Devo confessar que perdi as notas que tirei durante a nossa discussão e também que não me apetece fazer esse exercício de memória. Registo aqui apenas a recepção entusiástica da obra por parte de muitas das leitoras (nomeadamente a paula e a Guida). A discussão foi precedida do visionamento da mais recente adaptação para cinema da obra, realizada por Bernard Rose e interpretada por Sophie Marceau, Sean Bean (um belo Vronsky, sim senhoras, hão-de dizer-me onde está o vosso caixote do lixo!) e Alfred Molina. O filme é fraco, fraco, oh meu Deus, que fraquinho, e nem no que diz respeito à trama romântica da obra dá conta do recado, quanto mais no que concerne à tremenda complexidade das figuras de Ana Karenina, Vronsky, Karenin e LEvine. Em todo o caso, em termos visuais não deixa de resultar relativamente bem e é sempre curioso vermo-nos confrontados com outras visões de obras que já imaginámos à nossa maneira durante a leitura.
Da discussão propriamente dita, recordo-me das grandes polémicas em torno da personagem de Levine. Prometo completar este post se entretanto encontrar as minhas notas.

Discussão de “A misteriosa chama da Rainha Loana”, de Umberto Eco

Com uns meses largos de atraso, aqui fica mais esta pequena contribuição para a preservação das memórias do nosso clube de leitura. Se bem se lembram, a discussão realizou-se numa tarde deliciosa à beira de uma piscina, e as minhas tentativas de escrever algumas notas cedo se transformaram numa pasta informe de papel e tinta de esferográfica.
Ficam aqui apenas meia dúzia de notas de que me lembro. O resto das leitoras estão, como sempre, convidadas a resgatar do fundo (bem fundo e distante) da memória o que mais se lembrem da nossa discussão.

A opinião geral foi favorável, com as leitoras a reconhecerem que se trata de um romance bem construído. Tivemos todas pena que as profusas referências culturais nos sejam, na maior parte, alheias. Pensámos, contudo, que este livro deve constituir uma leitura apaixonante para um italiano da geração de Umberto Eco.

A Ana Cristina estabeleceu um paralelismo com “De Profundis. Valsa Lenta”, de José Cardoso Pires, que descreve o mesmo tipo de experiência, de acordar do coma mas de forma mais sucinta e, a seu ver, mais bem conseguida.
A mesma experiência mas mais sucinta. Entretanto descobri um pequeno excerto da obra de José Cardoso Pires, que transcrevo:

“De resto, a desmemória não só o isolou da realidade objectiva, como o destituiu, pode dizer-se, de sentimentos. Perdeu os estímulos de aproximação porque, sem a consciência da identidade que nos posiciona e nos define num framework de experiências e de valores, ninguém pode ser sensível à valia humana do semelhante. As suas virtudes ou os seus males só podem ser reconhecidos como significantes sentimentais em contraponto com a consciência da nossa identidade, isto é, com a tradição da comunicação que praticamos com a sociedade e com a nossa memória cultural. A ele tal coisa estava-lhe vedada, memória onde tu já ias. Daí a total indiferença em que navegava à tona das comoções e dos afectos, uma indiferença extrema que, sucedesse o que sucedesse , não o levava a perturbar nem ao de leve a disciplina do ambiente. Na verdade, não sabia de todo onde se encontrava, a razão era essa.”
(José Cardoso Pires in De Profundis, Valsa Lenta)


Discutimos a figura de Lila e como ela é uma figura idealizada que se aproximava dos estereótipos da BD.


Eu referi ainda um pouco do que me lembrava das teorias literárias de Umberto Eco, nomeadamente aquilo que designa de Lector in fabula
Estabelece-se um pacto entre leitor e autor, que permite ao leitor aceitar como verdade os dados que lhe são descritos no livro. Essa verdade existe dentro do contexto específico do livro, obedecendo às regras inerentes ao próprio texto, ainda que estas sejam inválidas no mundo “real”, como é o caso da literatura fantástica. O leitor tem, no entanto, um papel preponderante na construção desse mundo. É ele que o vai construindo à medida que lê, com a memória do que leu para trás no próprio livro mais os bocadinhos de memórias de todos os outros textos que já leu, e experiências que já viveu.
O que me parece muito interessante neste livro é que o leitor constrói a leitura em simultâneo com a personagem principal. Partimos do mesmo ponto, nós leitores da página em branco do início do livro, ele protagonista da memória em branco após o colapso.

Falámos longamente sobre a questão da identidade e de como nós somos aquilo de que nos lembramos. Fora da moldura das nossas memórias, é difícil pensar em termos de identidade.

Gostámos particularmente do episódio do copo inquebrável, a composição escrita por Yambo aos onze anos e que marca uma viragem radical na sua maneira de ser. A composição relata a existência de um copo de vidro inquebrável, que repetidamente o protagonista testa. A dada altura, e perante visitas, decide exibir a magia do copo e, para seu grande espanto e pesar, o copo parte-se em mil estilhaços. Comenta o narrador:
“Naqueles estilhaços que, focados pelo candeeiro, brilhavam (falsamente) como pérolas, eu celebrava, aos onze anos, o meu “vanitas vanitatum”, e professava um pessimismo cósmico.
Tinha passado a ser o narrador de um falhanço, do qual representava o frangível correlativo objectivo. Tinha passado a ser existencial, embora ironicamente, amargo, radicalmente céptico, impermeável a qualquer ilusão.” (p. 198~9)

Também nos enterneceu o episódio do Bruno, o menino que fica órfão e se sente humilhado pela caridade dos colegas e o seu grito de “Furo!”, enquanto todos os outros gritavam “Juro!” ao juramento fascista. Foi o primeiro acto de revolta a que assistiu o protagonista.

A descida do Vallone foi também um dos episódios mais marcantes para as leitoras, uma espécie de rito de iniciação nas crueldades da vida adulta.

3ª parte – respostas a tudo –
A Rita referiu uma teoria dos espaços em branco de Eiser (?), que na altura me pareceu muito prometedora, mas entretanto se me varreu da memória. Vou tentar ainda discutir isso com ela.

E pronto, é tudo do que me lembro!